sexta-feira, 10 de junho de 2011

secreta

Num rolê pós almoço

Fui parar no Teatro Amazonas.

O guarda que ficava na porta para evitar a entrada de visitantes fora de hora não estava lá.

Entrei,

claro.

Já tinha passeado por lá,

mas só durante espetáculos ou com algum guia chato falando muita coisa chata sobre borracha e outras coisas chatas.

Entrei e o silêncio ecoava,

os pilares adornados estavam mudos,

os quadros e afrescos espiavam,

fingindo-se de mortos.

Entrei na sala principal de espetáculos,

levantando pesadas cortinas de veludo vermelho.

Um piano tímido, meio bêbado,

começou a passear nos meus ouvidos.

O som parecia vir dos interiores das paredes,

do alto dos camarotes vazios,

dos corredores de cadeiras enfileiradas.

Fui caminhando pelo longo tapete, apreciando os lustres enormes,

a decoração cheia de curvinhas,

as pinturas e os cheiros antigos.

Cheguei perto do palco

e as notas do piano me chamavam mais altas, mais intensas.

Aquela melodia era um mistério pedindo atenção.

Devagarinho,

dei a volta no palco e entrei numa pequena passagem que,

para mim,

era secreta.

Fui parar num salão escuro,

todo entrecortado por longas cortinas pretas

que dificultavam a compreensão do espaço.

O som do piano belamente principiante tomava conta dos meus sentidos

e por ele fui guiado.

Após alguns passos,

logo vi.....

Em meio a escuridão,

numa clareira de luz amarelada,

lá estava uma inspirada senhora.

Vestido e cabelos brancos,

leves, sem peso.

Descalça

ela dançava e fazia amplos gestos com os braços,

olhos fechados, boca entreaberta,

ditando a melodia e o compasso da música que pairava.

Na sua frente, uma jovem mulher sentada ao piano de cauda.

Ela tinha umas tranças bonitas no cabelo e um olhar esforçado,

tentando traduzir em música os movimentos e expressões da senhora inspirada.

Fiquei observando aquela cena por alguns minutos,

sem que elas percebessem minha presença.

Depois,

saí com o mesmo cuidado com que cheguei,

e meus sentidos demoraram a voltar para a rotina.

Uma hora ou outra eles voltaram,

já era hora do trabalho.

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